segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Espaços estudantis

Quando pensamos em movimento estudantil, não há como não pensar no espaço físico dos centros acadêmicos. As sedes dos CAs são locais de integração dos estudantes, de reuniões e assembléias, de eventos, de festas, enfim. A preocupação com a organização do ME também deve incluir a discussão dos espaços estudantis.
Primeiramente, o entendimento de que entidade e espaço devem ser tratados de forma íntima é muito importante. Além de o espaço ser de propriedade de uma universida-de pública, a concessão de seu uso é direcionada para um coletivo, e não para atender as vontades de cada estudante em particular. Apesar disso, a confusão entre as idéias de total liberdade (soberania) e autonomia tende a ressurgir inúmeras vezes.

A idéia de autonomia implica na negação da ingerência da diretoria nos centros acadêmicos e nos espaços estu-dantis. O princípio de autonomia que ao menos oficialmente existe com as entidades estu-dantis e seus espaços, ambos reconhecidos pelo Estado, foi fruto de um processo intenso de luta dos estudantes no sentido de obter maiores garantias para o fortalecimento da entidade. Entretanto, alguns estudantes vêem o espaço do centro acadêmico como um outro país, onde não existem regras e onde todas as suas vontades podem ser realizadas; cria-se uma defesa da ‘soberania’, muitas vezes distorcendo a idéia de aumento dos direitos para a enti-dade como o aumento dos direitos pessoais e se esquecendo de que o centro acadêmico é uma entidade privada em regime coletivo. Nesses momentos de confusão, deve-se reafir-mar a idéia de que não há como se utilizar dos espaços estudantis esquecendo que a relação desses com as entidades de base é bastante estreita. Mas não se pode apenas depender de retórica; essa relação deve ser visível e concreta, de forma que as diretorias de CAs cum-pram o seu papel de organizar o uso dinâmico do espaço. Ao mesmo tempo, para a atuação plena das entidades de base, é essencial que se discuta também a disponibilidade de recur-sos dos centros acadêmicos.

Além dos gastos rotineiros com as atividades, manutenções e reformas são necessá-rias e trazem melhores condições físicas para que os estudantes se reúnam mais e mante-nham o interesse pela entidade. Para tanto, as entidades de base precisam de uma política de financiamento adequada, sendo que a estratégia para tal deve ser dividida em defesa de financiamento externo (pela diretoria do Instituto) e interno (auto-financiamento), tendo por finalidade a prioridade do segundo. O financiamento direto pela universidade possui a pro-blemática do acompanhamento estreito das atividades do CA por parte da diretoria do insti-tuto e, dependendo da conjuntura e das relações com tal diretoria, as entidades que se base-arem principalmente nesses financiamentos diretos podem ter a sua autonomia comprome-tida. Cabe então à diretoria do centro acadêmico planejar uma política de financiamento próprio, a qual pode incluir alocação (concessão de uma parte do espaço estudantil por e-xemplo para restaurantes e lanchonetes), considerada como auto-financiamento ou no má-ximo financiamento indireto pela universidade, além da geração de estrutura / concessão de certos direitos aos estudantes em troca de uma cotização; por exemplo, imagine que seja montada uma biblioteca e que os alunos pagassem pela carteirinha. Entretanto, a freqüente inexistência de capital inicial para a efetuação dos projetos nos faz novamente repensar o financiamento pela universidade. Assim a proposta mínima é que apenas inicialmente haja maior dependência de financiamento externo até que se crie estrutura, sendo o auto-financiamento posteriormente responsável por mantê-la. Vários argumentos exigindo fi-nanciamento pela universidade são mais do que sustentados e podem ser utilizados, entre eles aquele de que a diretoria do centro acadêmico tem a função de gerir o espaço e portan-to deveria possuir direito a um financiamento e o outro de que, como o Estado é dono do espaço e o CA é reconhecido pelo Estado, é razoável pensar que a entidade tivesse direito a parte do dinheiro por alocação.

Entretanto é óbvio que esse financiamento externo não é fácil e não será obtido ape-nas se apoiando nos argumentos colocados acima: são poucos os CAs da USP que possuem atualmente condições financeiras dignas. Mas em nenhum momento se disse que isso seria fácil. Compreendendo a atual estrutura burocrática da USP e a pequena participação dos estudantes nas decisões da universidade, é razoável imaginar que negociações desse tipo serão tratadas como trocas de favores e não necessariamente como um direito dos estudan-tes. Assim, os estudantes devem estar atentos às oportunidades que surgirem. Enquanto isso não acontece, os CAs da USP dependem, em sua maioria, da atual condição de financia-mento próprio, que é principalmente restrito à promoção de festas, o que é limitante para muitos projetos que possam ser imaginados pelo coletivo. De qualquer modo, é a opção que resta e, na verdade, por ser a principal forma de financiamento próprio atual já deveria ser bastante defendida. Além disso, a promoção de festas possui um outro efeito positivo.
Ao contrário do que muitos acreditam, a organização de festas por parte de um cen-tro acadêmico não se trata de um ato de despolitização. Desde seu primeiro dia na USP, as festas são uma constante para qualquer estudante. Nesses eventos, os estudantes têm a o-portunidade de encontrar pessoas de toda a USP – podendo assim ampliar seus conheci-mentos sobre a universidade – ou então simplesmente de se divertir depois de uma semana nem tão divertida de aulas, trabalho, assembléias, etc. Promover festas é simplesmente en-tender que nós não somos máquinas de fazer assembléias. Na realidade, argumentar contra essa liberdade dos centros acadêmicos de promoverem eventos de integração estudantil por se tratarem supostamente de tentativas de alienação acaba por gerar um distanciamento entre o corpo estudantil e as próprias diretorias de CAs, dissolvendo o papel destas no que se refere à representação do coletivo.

Portanto, a tentativa de se incrementar as finanças da entidade CA aliada à defesa dos espaços estudantis e ao incentivo de seu uso para as mais variadas atividades reivindi-cadas pelo coletivo dos estudantes desenvolvem a aproximação essencial para o funciona-mento dos centros acadêmicos e, assim, consistem em elementos indispensáveis para o fortalecimento do movimento estudantil.

Flavião e Juliano

Como deve ser um Centro Acadêmico?

Como deve ser um Centro Acadêmico?

Um centro acadêmico é a entidade de base de representação dos estudantes universitários. É oficialmente pela entidade CA que os anseios dos estudantes são publicizados e a partir do qual eventuais reivindicações são encaminhadas para os fóruns apropriados. A história dessa entidade é marcada por importantes lutas pelo direito dos estudantes e por um papel crítico a respeito de processos políticos como o regime militar brasileiro.
Mas ao falarmos em ‘centro acadêmico’, pensamos não apenas na entidade, mas também na diretoria que é eleita anualmente e que ao assumir adquire certas responsabilidades. Quanto a essas gestões, é bem capaz que a concepção colocada aqui não seja nenhuma novidade, ao menos na teoria. No entanto, quando observamos que o movimento estudantil da USP ainda sofre graves problemas de representatividade, temos a impressão de que muitos daqueles que se intitulam ‘militantes estudantis’ esqueceram de fazer a sua devida lição de casa.
Não é difícil afirmar pelo já exposto que se trata de uma incoerência óbvia o fato de uma diretoria de centro acadêmico construir uma gestão que destoe significativamente do interesse do coletivo que representa. Uma verdadeira diretoria de CA deve estar constantemente em pleno diálogo com os estudantes, compreendendo os seus interesses. Dessa forma, é equivocada a filosofia de que uma diretoria tem como responsabilidade trazer discussões para o conjunto dos estudantes. É justamente o contrário: os anseios e reclamações dos estudantes já estão presentes e são de alguma maneira debatidos e, portanto, a verdadeira função de uma diretoria de centro acadêmico é a de organizar e estimular o debate.
Ora, não se trata de apenas acatar ordens ou de se abdicar por completo de uma proposição política mais pessoal; em outras palavras, não se trata absolutamente de entender a diretoria como mera prestadora de serviços. Na verdade, é bem provável que uma gestão de CA possa dar acréscimos significativos ao corpo de discussão já presente no curso e esses acréscimos possuem diferentes causas. Causas que vão desde um potencial maior contato com a realidade de outros centros acadêmicos, conhecimento mais detalhado sobre o andamento das entidades gerais como DCE e UNE ou mesmo um maior domínio da questão abordada devido a uma discussão prévia da chapa durante o processo eleitoral. Aqui cabe uma observação: sendo a eleição disputada por chapas que teoricamente possuem cada uma certa coesão de conceitos políticos e de métodos, é razoável a defesa de eleições majoritárias, ou seja, aquelas nas quais haja apenas uma chapa vencedora; a fragmentação dos cargos de diretoria só leva a uma reunião forçada de concepções diversas e um previsível impedimento para a realização plena das funções da gestão. De qualquer forma, parece razoável afirmar que uma gestão de CA tem grandes condições de aprofundar as discussões políticas nos cursos. Entretanto, é fundamental que se diga que esse aprofundamento deve ser trabalhado sem que os debates sejam atropelados, sem que a gestão comece a ‘lecionar’ aos demais alunos, sem que se inicie um comportamento de ‘vanguarda’. Se a diretoria de um centro acadêmico possui material para incrementar as discussões, ela assim o deve fazer, mas não se esquecendo de seguir uma postura que respeite o ritmo natural do debate. Tal postura inclui a necessidade da percepção das particularidades de cada curso; a dinâmica de organização dos estudantes e o nível dos debates são bastante diferentes em cada curso e o real entendimento dessas diferenças é parte essencial do projeto de formação de diretorias representativas.
Ainda, outra questão conceitual importante é a necessidade de que um diretor de CA compreenda que todos os demais estudantes são sócios do centro acadêmico, de forma que, ao menos nas instâncias de deliberação mais importantes como são as assembléias de cursos, todos os estudantes possuem o mesmo peso de decisão. Dessa maneira, um diretor deve se portar nas discussões como mais um estudante que coloca suas posições, desenvolve argumentação e que, reconhecendo o valor de entidade de um centro acadêmico, respeita a posição final do coletivo. Atuar também nesse caso como ‘vanguarda’ - e, logo, peça mais importante - dum movimento estudantil policlassista se constitui numa atitude ilegítima.
Nota-se assim que as críticas ao vanguardismo não possuem apenas uma óptica conceitual, mas também pragmática. O vanguardismo se mostrou ineficiente no ME, sendo a perda geral de interesse pelas entidades estudantis a conseqüência lógica. Manter um comportamento de ‘parnasianismo político’, com discussões esquizofrênicas e decisões tomadas longe do grande conjunto dos estudantes, pode até soar benéfico para a ‘vanguarda’. Mas benéfico até que ponto? Como realmente colocar em prática algo contemplado apenas por uma minoria? Aparentemente difícil, tão difícil que o desinteresse é típico em vários CAs da universidade. O fato é que toda essa problemática só corrobora as idéias daqueles que desprezam o movimento estudantil.
Por tudo isso, é fundamental que se entenda e que se respeite a dinâmica e natureza das entidades de base. Os CAs devem ser verdadeiramente considerados suporte do movimento estudantil universitário. Isso por duas razões principais. Uma porque é justamente nas entidades de base, onde existe um maior contato pessoal, o local privilegiado para a organização dos estudantes. A outra razão, ainda mais importante, é que além de os debates já existirem entre o coletivo de um CA, eles são naturalmente realizados de um âmbito particular para um âmbito geral (e não o oposto). E se em algum momento vislumbrarmos um ME forte temos que ter em mente que qualquer processo de organização do coletivo se faz de forma gradual, estimulando a participação de todos e criando as condições para que as reivindicações dos estudantes sejam realizadas.

Flavião e Juliano

O QUE É TRABALHO DE BASE

O QUE É TRABALHO DE BASE - De Ranulfo Peloso da Silva (CEPIS)

Posted on 16/4/2007 at 10:19 in Subsídios
“Fé na vida, fé na gente, fé no que virá. Nós podemos tudo, nós podemos mais. Vamos lá fazer o que será”. (Gonzaguinha)


Trabalho de base não é receita ou mágica. É um jeito de fazer política onde o militante coloca sua alma. É uma paixão carregada de indignação contra qualquer injustiça, e cheia de ternura por todos que se dispõe a construir um mundo sem a marca da dominação. Essa convicção nasce do coração e da razão, torna-se força contagiante, capaz de vencer a fúria e a sedução da opressão e de comprometer-se com a transformação das pessoas e da sociedade.

Essa prática multiplicadora pode ser realizada nas favelas, nas ocupações de terra, nas fábricas, nas igrejas, nas instituições do Estado e nos espaços internacionais. Ela se sustenta quando mantém os pés no chão e a cabeça nos sonhos. Consegue vitórias quando articula as lutas econômicas com as diferentes lutas políticas e sociais. E perdura, em qualquer conjuntura, quando combina ações de rebeldia com as disputas na legalidade.

1. A finalidade do trabalho de base é:

a) Anunciar sempre que o ideal da humanidade é a prosperidade e a convivência solidária. E combater a ganância, a competição, a dominação. Quanto maior a opressão e a crise, maior a razão para propagar o sonho da sociedade sem classes.

b) Despertar a dignidade das pessoas e a confiança nos seus valores e no seu potencial. A pessoa se torna feliz e perigosa (para as elites), quando começa a andar com os próprios pés. Em geral, quem está no poder, prefere gente obediente e conformada, porque é fácil manipular uma população domesticada e dependente.

c) Canalizar a rebeldia popular na luta contra a injustiça e na construção de uma sociedade de homens e mulheres novos, onde a produção, distribuição e consumo, sejam orientados pela lógica da solidariedade.

d) Transformar a realidade e conseguir vitórias em todos os campos e em todas as dimensões, que satisfaçam os justos anseios da população.


2. A força do trabalho de base está:

a) Na sua sustentação de base: o trabalho de base tem que ter raízes plantadas na alma da população que é a base da sociedade. Por causa desse alicerce, ele sempre renasce e se reproduz. Não é um movimento para os trabalhadores. É dos trabalhadores. O povo deve se sentir parte dessa construção e companheiro da mesma caminhada. Para isso, o trabalho de base se organiza lá onde o povo vive e trabalha. Para combater dentro de cada um o vício da dependência, é preciso que cada pessoa, desde o início, contribua com disposição, idéias e sustentação financeira das atividades.

b) Na crença do povo: a razão do trabalho de base é ajudar o povo a entender e se comprometer com a vida feliz e solidária. Mas sabe que esse povo já luta porque precisa sobreviver. O povo está sempre reagindo contra a exploração e a dominação, mesmo quando não fala a linguagem dos militantes ou entra em caminhos eu são armadilhas. A história tem mostrado que, apesar de toda a miséria e de toda a contradição, o povo é a sementeira permanente de novas formas de luta e de novos militantes.

c) Na clareza de que a organização popular, sendo uma parte, é parte para incluir todo o povo. Os dirigentes não são guias geniais, mas lideranças indispensáveis que ajudam o povo a entender a realidade e organizar os esforços, no rumo da transformação. No processo, o povo vai assumindo-se como sujeito de sua história. É como diz o poeta “sentindo na vida que pode, o pobre entende o que vale; depois que a canga sacode, não há patrão que o cale”.

d) Na coerência entre rumo e caminho: no trabalho de base não tem essa de fazer a cabeça. A pessoa deve abraçar a causa, porque foi convencida de que ela é justa. Então, o jeito de tratar as pessoas, deve estar de acordo com a finalidade que queremos atingir. Fica difícil falar de liberdade se, na prática diária, as pessoas mantém um comportamento autoritário e antidemocrático. É verdade que, quem não sabe onde quer chegar, não chega lá nunca”. Mas, é igualmente verdade, que o fim é o caminho que a gente faz, para chegar no objetivo. Quer dizer, o método que se pratica, deve ser coerente com os objetivos que se pregam.

e) Na metodologia multiplicadora: cada militante que se convence, assume o compromisso de mobilizar um time de novos companheiros. Estes, por sua vez, vão repartir os esclarecimentos e as experiências com outros colegas que vivem em muitos espaços de luta, de vida, e de trabalho. Assim se vai tecendo a rede de resistência e de solidariedade, para a conquista de vitórias.

f) No planejamento das ações: ninguém entra de peito aberto numa guerra. É indispensável traçar um caminho, capaz de levar à vitória. O planejamento enfrenta o medo de mexer no comodismo das pessoas e na indisciplina da prática espontaneísta. Na luta popular, como no futebol, o objetivo não é chutar a bola. É preciso avançar e se defender organizadamente, na hora certa e com as pessoas certas. Por isso, marcam-se pontos e prazos de chegada; faz-se uma caprichada preparação dos militantes; escolhem-se responsáveis pelas atividades; realiza-se um balanço dos resultados, em cada etapa da luta.

g) No amor pelo povo e pela vida: o trabalho de base é mais que um trabalho profissional, feito por pessoas competentes. Ele tem um segredo que anima a esperança dos militantes, chegando à doação da própria vida. O valor da vida, a dignidade das pessoas, a rebeldia para a liberdade e a fraternidade universal, formam a base dessa paixão que invade a alma dos militantes e dá sentido à sua disposição e dedicação. No concreto, essa convicção se traduz no respeito ao povo, no carinho aos iniciantes, no cumprimento dos acertos coletivos, na capacidade de tomar iniciativas, na coragem de encarar os desafios, nos gestos de indignação, entusiasmo e celebração. O amor pelo povo e pela vida se expressa, de maneira plena, nas manifestações individuais e coletivas do companheirismo.

Ranulfo Peloso da Silva

CEPIS, SP - A RETOMADA DO TRABALHO DE BASE

Saudações

Após o último encontro do ssampa, resolvemos abrir mais um espaço virtual para que todos possam compartilhar suas idéias e darem pitacos nas dos outros..............sinta-se em casa e deixe o verbo fluir...